O preço recorde dos imóveis em Portugal, com altas expressivas tanto para compra quanto para aluguel, tem feito imigrantes brasileiros buscarem cidades pequenas ou no interior do país, onde ainda há opções mais em conta.
A pequena dimensão do território luso —quase do tamanho de Pernambuco—, aliada a uma boa infraestrutura de estradas e de fibra óptica, que cobre mais de 87% dos domicílios, permite que profissionais trabalhem longe dos centros sem grandes dificuldades adicionais.
O deslocamento para cidades menores é uma tendência da mais recente onda de imigração brasileira, de acordo com a Casa do Brasil em Lisboa, ONG que presta auxílio à comunidade em Portugal.
“São muitos perfis variados, de estudantes até trabalhadores de todas as áreas. As pessoas têm procurado cidades menores motivadas sobretudo pelo preço da habitação”, diz Cyntia de Paula, presidente da instituição.
Dados do Instituto Nacional de Estatística mostram um aumento no preço dos imóveis em todo o país. Comprar uma casa agora custa em média 50% mais do que há cinco anos.
Em busca de uma vida mais tranquila, conjugada a um custo menor do que nas grandes cidades, a publicitária carioca Rafaela Salles mudou-se com a família, em julho de 2021, para a pequena Freamunde.
Com cerca de 7.500 habitantes, o município fica no norte de Portugal, a cerca de 45 quilômetros do Porto, a segunda maior cidade do país. Salles, que trabalha para uma empresa brasileira em esquema remoto, diz que a experiência até agora tem sido positiva.
“No Rio, eu pegava duas horas de engarrafamento todos os dias. Morria de medo de ser assaltada. Agora, estamos num lugar seguro, trabalhamos de casa e meu filho estuda numa escola aqui pertinho. Conseguimos a tranquilidade que buscávamos”, afirma.
Segundo a publicitária, a oferta cultural e de serviços em cidades vizinhas complementa aquilo que não encontra em Freamunde, e o preço acessível dos imóveis é um dos grandes destaques da região. “Embora as coisas já estejam ficando mais caras aqui, ainda é possível achar um bom imóvel para alugar por menos de 500 euros [R$ 2.570] por mês. Moro num apartamento de três quartos, que agora já é meu, mas que, quando eu alugava, custava 350 euros [R$ 1.800]. Em Lisboa, isso é o preço de um quarto.”
A principal queixa, por enquanto, é a dependência do carro para algumas situações. Salles diz não haver grande oferta de transporte público, o que dificulta a rotina, por exemplo, de quem precisa ir ao Porto com frequência, já que a estação de trem mais próxima não fica na cidade.
Em Portugal desde 2017, a chef e empresária Jessica Torres não pensava em sair de Lisboa até o começo da pandemia de Covid e o desenvolvimento de um quadro de burnout.
Inspirada por um amigo que também trocou a capital por uma cidade mais afastada, ela decidiu que era hora de desacelerar e buscar novos ares. Além da qualidade de vida, o preço da habitação pesou na decisão de se mudar para Vialonga, a 20 quilômetros de Lisboa.
“Saí de um apartamento de um quarto para um de dois dormitórios. Agora tenho terraço e uma ótima cozinha, quintal para pegar sol e ainda pago menos do que antes”, diz ela, que já pensa em comprar uma propriedade rural.
Após anos como sócia de restaurantes na capital portuguesa, a chef passou a trabalhar de casa, produzindo bolos por encomenda. “As pessoas aqui são muito simpáticas. Já conheço muitos vizinhos. Tenho quatro supermercados perto de casa, uma manicure e um mecânico de confiança. São coisas que, em quatro anos, nunca tive em Lisboa”, afirma.
Empresas de recolocação e assessorias de imigração também identificaram o movimento e passaram a expandir seus portfólios, incluindo muitas ofertas fora das tradicionais opções concentradas em Lisboa e no Porto.
Proprietária da assessoria Vou Mudar para Portugal, a empresária Patrícia Lemos conta que precisou criar uma equipe especializada no atendimento a quem procura cidades pequenas. “O brasileiro com planos de se mudar para Portugal começou a se deparar com uma realidade muito dura, que foi o encarecimento brutal dos imóveis. Então, devido ao preço, muita gente acabou considerando cidades menores”, diz.
Na avaliação da empresária, muitos brasileiros ainda têm certa resistência à ideia, baseada sobretudo na concepção de que municípios menores não contam com boa infraestrutura para as famílias.
Depois do sucesso de Braga, cidade vizinha ao Porto que foi a queridinha dos brasileiros nos últimos anos, Leiria, na região central de Portugal, vem se destacando entre os recém-chegados.
O distrito, cuja capital tem o mesmo nome, tem boa oferta de serviços de saúde e de educação, além de opções de comércio. A região tem ainda um importante polo industrial. “Leiria fica a 140 quilômetros de Lisboa e conta com imóveis a preços excelentes. É uma zona pacata e com bom mercado de trabalho devido às fábricas”, afirma Lemos.
As estatísticas do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) mostram o interesse crescente dos imigrantes pela região. Em 2020, dado mais recente disponível, havia 24.788 cidadãos estrangeiros residentes no distrito de Leiria, alta de 14,5% em relação ao ano anterior. Em comparação a 2015, houve aumento de 69,2% da população imigrante.
As cidades pequenas e médias também fazem sucesso nas redes sociais, diz Lemos, que compartilha dicas e informações sobre morar em Portugal em seu perfil no Instagram, no qual reúne quase 350 mil seguidores.
O governo de Portugal e as autoridades municipais costumam ver com bons olhos o interesse dos brasileiros por regiões menos exploradas do país. Com uma das taxas de natalidade mais baixas da Europa, o país tenta conter o despovoamento do interior e das pequenas cidades. Em alguns casos, é possível contar até com fundos específicos de apoio para a mudança, por meio do programa Emprego Interior Mais (Mobilidade Apoiada para um Interior Sustentável).
Como forma de incentivar a fixação de população mais jovem, o governo oferece até 4.827 euros (R$ 25,8 mil) para quem se mudar do litoral para o interior do país para trabalhar. Estrangeiros podem se candidatar ao programa, desde que obtenham a documentação adequada para residir no país.
Em 2021, o número de brasileiros em Portugal atingiu o recorde da série histórica, com a marca de 209.072 pessoas residindo legalmente no país.
Embora já expressiva —os brasileiros representam quase 30% de todos os estrangeiros em Portugal—, a cifra é maior. O número não inclui quem tem dupla cidadania portuguesa ou de outro país da União Europeia nem os que estão em situação irregular no país.
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