Quantidade de solicitações dobra em dois anos; número de atendimentos também bate recorde
O número de brasileiros que querem usar o sistema público de saúde de Portugal disparou nos últimos dois anos, impulsionado principalmente pelo aumento da imigração.
Segundo dados do Ministério da Saúde, a quantidade de pedidos de brasileiros para usarem o sistema alcançou em 2019 o valor mais alto da série histórica antes mesmo de o ano acabar.
Até 1º de dezembro, foram 87.596 documentos, de acordo com os dados da pasta —cerca de 5.000 a mais do que o recorde do ano anterior.
A mineira Érica Silva é um desses brasileiros. Ela diz ter ficado em pânico ao descobrir estar grávida menos de seis meses após chegar a Portugal, onde estava em situação migratória irregular.
“Fiquei com medo de não ter condições para ganhar minha bebê. Mas, no centro de saúde mesmo, já me explicaram que, por conta do PB4 [documento emitido pelo Ministério da Saúde brasileiro], eu não precisaria me preocupar com o acesso a hospital”, afirmou ela.
O documento em questão é o CDAM (certificado de direito à assistência médica), também conhecido como PB4, que garante que os brasileiros, mesmo sem visto adequado para morar em Portugal, tenham acesso ao sistema público de saúde da mesma forma que um cidadão português.
Os brasileiros se beneficiam de um acordo bilateral celebrado com o governo de Portugal que garante reciprocidade no acesso à saúde.
Ou seja: portugueses, de forma semelhante, também têm direito de usar o SUS (Sistema Único de Saúde).
O Brasil tem acordos semelhantes com a Itália e com Cabo Verde.
Embora o PB4 também seja procurado por turistas que querem evitar gastos com um seguro-saúde particular, é entre os brasileiros que migraram que ele vira unanimidade.
Vídeos que ensinam a pedir o documento e a usá-lo, mesmo para quem não tem autorização legal para residir no país, acumulam milhares de visualizações.
Para solicitar o CDAM para Portugal (a documentação varia de acordo com o país), é exigida a apresentação do RG, CPF, passaporte válido e comprovante de residência no Brasil. O pedido pode ser feito pela internet.
O aumento expressivo na procura pelo PB4 coincide com um aumento dos migrantes brasileiros em Portugal. Em 2018, houve uma alta de 23,4% em relação ao ano anterior. Foi a segunda alta consecutiva, após um período de seis anos de quedas nos números oficiais (de 2011 a 2016).
Os dados, porém, não contabilizam os imigrantes irregulares, o que significa que a comunidade brasileira, em termos reais, cresceu bem mais.
Até outubro de 2019, o Ministério da Saúde português contabilizou 613.522 atendimentos a cidadãos com nacionalidade brasileira, incluindo cuidados de saúde primários, serviços de urgência, consultas hospitalares e internações.
O resultado representa um aumento de 68,4% em relação ao mesmo período de 2017.
Na rede pública portuguesa, ao contrário da brasileira, nem todos os atendimentos são gratuitos. Em alguns casos, como na ida à emergência de um hospital, é cobrada a chamada taxa moderadora: o governo subsidia a maior parte do custo, mas o usuário final ainda arca com uma tarifa.
“Em Portugal, por exemplo, se o português pagar por um procedimento de saúde, o brasileiro também deverá pagar. Da mesma forma, os procedimentos gratuitos ao nativo também serão gratuitos aos portadores do CDAM”, explica o ministério, em nota.
Grávidas, desempregados e menores de 18 anos são algumas das categorias que estão totalmente isentas de pagamento nos estabelecimentos de saúde.
Apesar do acesso facilitado a hospitais e consultas, quem vive de maneira irregular no país, ainda que tendo o PB4, pode enfrentar algumas dificuldades no acesso subsidiado a medicamentos.
Reconhecido com um modelo de sucesso na Europa, o serviço público de saúde em Portugal tem enfrentado uma sucessão de problemas e queixas nos últimos meses, especialmente quanto à falta de médicos especialistas e às longas horas de espera.
No fim de junho, um relatório divulgado pela Comissão Europeia apontou redução nos investimentos na área. A despesa pública portuguesa na saúde caiu para 6,1% do PIB, enquanto a média europeia é de 7,8% do Produto Interno Bruto.
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